23 outubro 2009

Auto-crítica

Por: Karl Kepler

Ao invés da liberdade e tranqüilidade de Jesus, de poder freqüentar tanto fariseus quanto publicanos, temos ficado mais “presos” – freqüentando, no máximo, os “fariseus”.
Por quê? Provavelmente, por termos medo de errar. Parece que, apesar de confessarmos nossa fé, não acreditamos que o problema do pecado esteja realmente resolvido, que a obra de Cristo de fato consumou tudo o que era necessário para nossa glorificação e ida ao céu. Criamos uma divisão entre “salvação” e “santificação”; enquanto a primeira continua sendo pela fé, tal como pregamos nos sermões evangelísticos, a segunda, dizemos, só se conseguiria com muito compromisso, seriedade, empenho, combate, enfim, “obras”, tal como pregamos em nossos sermões doutrinários.
Assim como na Galácia de Paulo, parece que começamos pelo Espírito, pela fé e na liberdade de Cristo, mas queremos acabar no esforço, no comportamento controlado segundo padrões, princípios e leis, ou seja, “confiando na carne”. O resultado é que não crescemos espiritualmente: nossas igrejas são imensos berçários, boas para bebês de todas as idades, mas que não sabem lidar com jovens e adultos.
Temos medo de pecar, medo de sermos castigados, de perdermos a bênção. Por isso, agimos como o terceiro servo da parábola dos talentos.
Se tenho medo de errar, não vou me arriscar na luta política e social; não vou me meter a discutir economia – as chances de errar são grandes. Não vou entrar em temas polêmicos, não vou buscar ajudar os oprimidos, sejam crianças, sejam menores infratores, sejam mulheres, negros, homossexuais, indígenas – todos esses grupos estão cheios de exemplos de má conduta, e eu não quero correr esse risco. O que sobra? Quase só achar erros nos outros. De ação afirmativa, talvez Ecologia, especialmente plantas, já que elas não fazem mal a ninguém; aborto, já que fetos não pecam; e alguma caridade aos pobres, desde que não envolva participar de nenhum movimento de reivindicação.
Falta-nos a segurança da fé, a paz de Jesus; a certeza de que podemos também errar, que não será o fim do mundo, porque foi exatamente por nossos erros que Jesus morreu.
Na linguagem de Rm 8.15, falta-nos o amor de filhos: em vez dele, continuamos com o temor de servos. Nossas almas não se erguem para clamar “Aba, Pai”; em vez disso, elas se curvam e dizem: “Sim, Senhor, sim Senhor”.
Como resultado, nos sentimos o tempo todo como servos, não como livres. Um servo precisa esforçar-se o tempo todo para tentar não errar. O filho, que é livre, pode dedicar-se a tentar acertar. Parece semelhante, mas na verdade é muito diferente: o coração do servo está sempre preocupado; o coração do filho está em paz.

Dever de Servo

A vida dos nossos crentes está quase totalmente orientada pelo dever: o crente deve ir à igreja, deve dar o dízimo, deve evangelizar, deve ler a Bíblia, deve jejuar, orar, ofertar, etc. e etc. A pergunta que o crente mais faz é “qual a vontade de Deus?” ou sua equivalente: “o que eu devo fazer?”. Pois essa pergunta foi feita a Jesus, quando os judeus estavam começando a reconhecer sua importância, após a multiplicação dos pães: “O que Deus quer que a gente faça? Jesus respondeu: Ele quer que vocês creiam naquele que ele enviou!” (Jo. 6.28,29). Mais adiante, aos discípulos, ele resumiu sua vontade em um mandamento só: amar uns aos outros como Ele nos amou.
Ora, amar não se faz por dever – não se consegue; você consegue obedecer por dever, servir por dever, mas amar, não. Só pessoas livres podem amar; por isso Jesus disse aos mesmos discípulos: “já não vos chamo servos, mas vos chamo amigos” (Jo. 15.15). E liberdade, pelo que parece, nos falta.
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