09 julho 2009

A Arte da Frustração


Por: Daniel Liberato

Vivemos em tensão entre o triunfo e o desastre. Entre começar e ainda não ter chegado ao fim. Não temos a certeza que as nossas decisões nos levarão ao sucesso. Esta é uma das maiores fontes de ansiedade e apreensão para nossas vidas. Mas podemos aprender a lidar com isto através do exemplo do apóstolo Paulo.
Paulo escreveu aos filipenses: "Não digo isto como por necessidade, porque já aprendi a estar contente com o que tenho. Sei estar abatido, e sei também ter abundância; em toda a maneira, e em todas as coisas estou instruído, tanto a ter fartura, como a ter fome; tanto a ter abundância, como a padecer necessidade. Posso todas as coisas em Cristo que me fortalece".
Contente é a palavra chave. Em grego autarkeia. Um termo não religioso, ou seja, "secular". Na literatura antiga costumava ser utilizado pelos estóicos - com os quais Paulo estava familiarizado. O Estoicismo, cujo fundador foi Zenão de Cício (Chipre), filósofo grego, que aconselha a indiferença e o desprezo pelos males físicos e morais. Autarkeia significa auto-suficiência, competência, domínio próprio. O lêxico grego define como: "o estado de alguém se sustentar sem o auxílio de outros". Esta era uma das características prediletas dos estóicos.
Porém, Paulo emprega um significado diverso. Acrescenta a dimensão "de Deus". Ele cita este termo mais duas vezes. Aos coríntios escreveu: "E Deus pode dar muito mais do que vocês precisam para que vocês tenham sempre tudo o que necessitam e ainda mais do que o necessário para fazerem todo tipo de boas obras." (2 Co 9.8). E a Tímoteo escreveu: "De fato, grande fonte de lucro é a piedade com o contentamento" (1 Tm 6.6). Nestes textos Paulo diz que por causa de Cristo ele tem aprendido a estar contente.
Portanto a autarkeia - esta capacidade centrada em Deus de administrar situações, de resistir, de estar contente em qualquer situação - dá substância ao viver diário. "Autarkeia" dá sentido às pessoas de todos os segmentos da vida, sejam programadores de computador, estudantes, motoristas de táxi ou operadoras de telefonia. Ou ministros cristãos, como Paulo.
E de onde Paulo fala isto? De uma confortável poltrona, ou de um sala de estudos? Não. Paulo escreveu da cela de uma prisão, em sua primeira viagem a Europa, quando se vê acusado injustamente em Filipos. E isto acontece com as pessoas todos os dias. Com o atleta impedido de competir por causa de uma contusão. Ou com o pastor cujas novas idéias para adiministração da igreja são atiradas pela janela por um conselho insensível. Quem opera orientado por um objetivo, uma visão de longo prazo, aprende a recuar e analisar os próprios fracassos.
Paulo nos mostra que uma derrota não é o fim do mundo. Essa é a questão. Quando lhe arrancam das mãos seu triunfo, quando suas energias começam a acabar e as escoras que lhe servem de sustentação são removidas, quem você é?
Devemos encarar a adversidade como parte da vida. Mas, na prática, quando o sofrimento chega, o cristão (se tiver o mínimo de semelhança comigo) diz: "Por que eu? Por que isso tinha que acontecer? Não sou filho de Deus?" Encara o sofrimento como uma interrupção. Só depois que passa, ele consegue mais uma vez levar uma vida cristã "frutífera". Engano seu; o sofrimento é a vida cristã. Temos a tendência de considerar importantes somentes os momentos bons, de conquistas. Mas não é bem assim. Temos que acreditar, como Paulo, que Deus está operando quando nada parece acontecer.
Autarkeia. Aprenda a lição da suficiência bíblica, em piedade, e mantenha-se na pista do aprendiz - desenvolvendo uma estrutura que permaneça quando tudo à sua volta parecer ruir. Desse modo, cumpriremos o objetivo de nossa vida como um todo, qual seja, o de crescer à semelhança de Cristo.
O famoso poema de Rudyard Kipling recebeu o nome simples de If [Se] - mas poderia se chamar com igual propriedade, A Arte da Frustração, pois é uma demonstração do espírito resistente, perseverante, que devemos ter ante cada provação e desastre.

SE

Se és capaz de manter tua calma, quando,
todo mundo ao redor já a perdeu e te culpa.
De crer em ti quando estão todos duvidando,
e para esses no entanto achar uma desculpa.

Se és capaz de esperar sem te desesperares,
ou, enganado, não mentir ao mentiroso,
Ou, sendo odiado, sempre ao ódio te esquivares,
e não parecer bom demais, nem pretensioso.

Se és capaz de pensar - sem que a isso só te atires,
de sonhar - sem fazer dos sonhos teus senhores.
Se, encontrando a Desgraça e o Triunfo, conseguires,
tratar da mesma forma a esses dois impostores.

Se és capaz de sofrer a dor de ver mudadas,
em armadilhas as verdades que disseste
E as coisas, por que deste a vida estraçalhadas,
e refazê-las com o bem pouco que te reste.

Se és capaz de arriscar numa única parada,
tudo quanto ganhaste em toda a tua vida.
E perder e, ao perder, sem nunca dizer nada,
resignado, tornar ao ponto de partida.

De forçar coração, nervos, músculos, tudo,
a dar seja o que for que neles ainda existe.
E a persistir assim quando, exausto, contudo,
resta a vontade em ti, que ainda te ordena: Persiste!

Se és capaz de, entre a plebe, não te corromperes,
e, entre Reis, não perder a naturalidade.
E de amigos, quer bons, quer maus, te defenderes,
se a todos podes ser de alguma utilidade.

Se és capaz de dar, segundo por segundo,
ao minuto fatal todo valor e brilho.
Tua é a Terra com tudo o que existe no mundo,
e - o que ainda é muito mais - és um Homem, meu filho!

(Baseado no cap.6 do livro "Dito e (ás vezes) feito" de Richards Bewes, Ed. Vida)

2 comentários:

Anônimo disse...

Adorei!!!
O Texto foi muito bem elaborado,
Parabéns!!!

Anônimo disse...

Adorei!!!
O Texto foi muito bem elaborado,
Parabéns!!!